Não foi apenas com o rei Roberto Carlos que Raul Seixas polemizou.
Também fez questão de confrontar outro gênio da Música Popular Brasileira, que atendia pelo nome de Antônio Carlos Belchior.
Em 1976, Belchior compôs a música “Apenas Um Rapaz Latino Americano”, um clássico inesquecível, que dizia assim:
"Eu sou apenas um rapaz latino-americano Sem dinheiro no banco sem parentes importantes E vindo do interior
Mas trago de cabeça uma canção do rádio Em que um antigo compositor baiano me dizia Tudo é divino tudo é maravilhoso
Mas trago de cabeça uma canção do rádio Em que um antigo compositor baiano me dizia Tudo é divino tudo é maravilhoso
Tenho ouvido muitos discos conversado com pessoas Caminhado meu caminho Papo, som, dentro da noite E não tenho um amigo sequer Que ainda acredite nisso não Tudo muda E com toda razão
Eu sou apenas um rapaz latino-americano Sem dinheiro no banco sem parentes importantes E vindo do interior
Mas sei que tudo é proibido Aliás, eu queria dizer Que tudo é permitido até beijar você no escuro do cinema Quando ninguém nos vê
Mas sei que tudo é proibido Aliás, eu queria dizer Que tudo é permitido até beijar você no escuro do cinema Quando ninguém nos vê
Não me peça que eu lhe faça uma canção como se deve Correta, branca, suave, muito limpa, muito leve Sons, palavras, são navalhas E eu não posso cantar como convém Sem querer ferir ninguém
Mas não se preocupe meu amigo Com os horrores que eu lhe digo Isso é somente uma canção A vida realmente é diferente Quer dizer Ao vivo é muito pior
E eu sou apenas um rapaz latino-americano Sem dinheiro no banco Por favor não saque a arma no "saloon" Eu sou apenas o cantor
Mas se depois de cantar Você ainda quiser me atirar Mate-me logo à tarde, às três Que à noite tenho um compromisso e não posso faltar Por causa de vocês
Mas se depois de cantar Você ainda quiser me atirar Mate-me logo à tarde, às três Que à noite tenho um compromisso e não posso faltar Por causa de vocês
Eu sou apenas um rapaz latino-americano Sem dinheiro no banco sem parentes importantes E vindo do interior Mas sei que nada é divino Nada, nada é maravilhoso Nada, nada é secreto Nada, nada é misterioso, não
Na na na na na na na na".
Eis que nosso valente Raulzito resolveu também debochar do compositor cearense!
Compôs, com Paulo Coelho, também em 1976, “Eu Também Vou Reclamar”, que dizia assim:
"Mas é que se agora pra fazer sucesso Pra vender disco de protesto Todo mundo tem que reclamar
Eu vou tirar meu pé da estrada E vou entrar também nessa jogada E vamos ver agora quem é que vai guentar
Porque eu fui o primeiro E já passou tanto janeiro Mas se todos gostam Eu vou voltar
To trancado aqui no quarto De pijama porque tem visita estranha na sala Aí eu pego e passo a vista no jornal
Um piloto rouba um mig Gelo em Marte, diz a viking Mas no entanto não há galinha em meu quintal Compro móveis estofados Me aposento com saúde Pela assistência social
Dois problemas se misturam A verdade do universo A prestação que vai vencer Entro com a garrafa De bebida enrustida Porque minha mulher não pode ver
Ligo o rádio e ouço um chato Que me grita nos ouvidos Pare o mundo que eu quero descer
Olhos os livros na minha estante Que nada dizem de importante Servem só pra quem não sabe ler
E a empregada me bate à porta Me explicando que tá toda torta E já que não sabe O que vai dá pra mim comer
Falam em nuvens passageiras Mandam ver qualquer besteira E eu não tenho nada pra escolher
Apesar dessa voz chata e renitente Eu não to aqui pra me queixar E nem sou apenas o cantor
Que eu já passei por Elvis Presley Imitei Mr. Bob Dylan, you know Eu já cansei de ver o sol se pôr
Agora eu sou apenas um latino-americano Que não tem cheiro nem sabor
E as perguntas continuam sempre as mesmas Quem eu sou? Da onde venho? E aonde vou, dá?
E todo mundo explica tudo Como a luz acende Como um avião pode voar Ao meu lado um dicionário Cheio de palavras que eu sei que nunca vou usar
Mas agora eu também resolvi Dar uma queixadinha Porque eu sou um rapaz latino-americano Que também sabe se lamentar
E sendo nuvem passageira Não me leva nem à beira Disso tudo que eu quero chegar E fim de papo".
Percebam que Raulzito induz a se pensar que Belchior é “apenas um rapaz latino-americano que não tem cheiro nem sabor” ou que ele, assim como Belchior, é “um rapaz latino-americano que também sabe se lamentar”.
Que pancada!
Mas, pelo visto, Belchior não guardou mágoas.
Melhor assim.
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